Associação Positivo, por Maria João Brás Santa Maria
Maria João, 51 anos, casada, Mãe, avó e seropositiva.
É casada desde 2005, mas começou a namorar com o seu marido desde os 9 anos de idade O único AMOR que teve foi este homem, com quem vive uma história de AMOR, com altos e baixos, de luta e sobrevivência, mas que tem vindo a sobreviver a tudo desde o uso e consumo de drogas ao VIH, tentando quebrar o estigma e preconceito em relação a estes temas tão visíveis na sociedade e tão pouco falados.
Esta mulher, consumidora de drogas dos 16 anos ate aos 28 anos, foi infetada na partilha de material injetável. Descobre em 1995, aos 23 anos, que está infetada ao oitavo mês de gravidez, através de umas análises e na fase que estava na desintoxicação do uso de drogas.
Em várias fases da doença já esteve com SIDA, hoje é só seropositiva e portadora de VIH, não tendo qualquer limitação por parte desta.
Disseram-lhe aos 28 anos que tinha 6 meses de vida porque tinha outras doenças associadas. No entanto, foi uma das primeiras mulheres a dar a cara em Portugal por campanhas de VIH/SIDA para quebrar o estigma e deixarem de ser excluídas pela sociedade.
Neste momento, está a coordenar um projeto para trabalhadoras do sexo na Associação Positivo, associação que assegura o respeito integral dos direitos humanos das pessoas que vivem com VIH/SIDA.
Nesta entrevista ao Love with Pepper, Maria João fala-nos que apesar de não ter uma vida fácil e através da sua resiliência não desistiu dos seus sonhos e conseguiu contruir uma família e consegue ter uma vida perfeitamente normal ainda que seja seropositiva.
Para si o que é o VIH/SIDA?
O VIH é vírus que destrói o nosso sistema imunitário e quando este se desenvolve pode dar origem a uma doença oportunista e aí entramos em estado SIDA.
Quais foram os seus sintomas?
Nunca tive qualquer tipo de sintomas.
Como é receber a notícia que se tem VIH/SIDA?
Não é muito fácil. Na verdade, quando recebi a notícia que estava com VIH/SIDA, tinha-me dirigido ao hospital com uma gastroenterite aguda, tendo que ficar internada e quando acordo vejo na minha cama um papel escrito a dizer SIDA. Entrei em choque e pedi para chamar um médico para me dizer o que se passava, porque ninguém me tinha informado e também não tinham a certeza do que era.
Como é ter conhecimento que estava infetada e ao mesmo tempo gravida? Como foi viver essa situação toda?
Na altura que estava grávida, Decidi entrar na Remar porque queria parar com as drogas para que o meu filho não nascesse a ressacar. A Remar é uma organização gratuita que nos ajuda a ficar abstinentes das drogas sem qualquer terapia. Tive um parto normal e o meu filho nasceu com uma hepatite C, transmitida por mim, mas não com VIH. O meu filho não é seropositivo.
Como foi informar o seu núcleo social desta doença?
Recordo que mal tive conhecimento liguei ao meu namorado, atualmente meu marido e aos meus amigos, não disse nada à minha família porque achei que ia ser descriminada no núcleo familiar e não me ia acrescentar em nada na minha vida. No entanto, tenho uma vida social perfeitamente normal.
Após o diagnóstico do VIH, como foi retomar a sua vida sexual?
Nós os dois tínhamos conhecimento que estávamos infetados e na altura não se tinha o conhecimento que se tem hoje e não usávamos proteção. Hoje faria de maneira diferente, usaria proteção para não correr o risco de transmissão de outros vírus.
Quais as precauções que tem na sua vida sexual?
Sendo eu portadora de uma carga viral indetetável não sou uma pessoa transmissível. Por acaso, só tive e tenho uma relação estável e posso ter uma vida sexual perfeitamente normal, sem qualquer risco de transmissão. Hoje em dia, as pessoas com VIH podem ter uma vida sexual normal, porque é fácil controlar o vírus através da medicação, sendo esta muito simples, é apenas um comprimido por dia.
De que forma é que os fármacos para o tratamento do VIH, lhe afetaram a libido, desejo, excitação e lubrificação?
Acho que me afetaram, embora os médicos digam que não. Estou com 50 anos, na entrada da menopausa, estou com a minha libido reduzida e não sei se também está relacionado com o VIH. Mas o meu marido por vezes tomou alguns retrovirais e provocam-lhe impotência sexual.
Nos dias de hoje, sabendo que é portadora desta doença sente-se uma mulher segura a nível sexual?
Sim, porque tenho relações sexuais só com uma pessoa, o meu marido que me tem acompanhado durante estes anos todos. Mas sinto que os utentes da associação se sentem muito inseguros a nível sexual porque ainda existe muito estigma e falta de informação.
Tendo em conta que a terapia evolui bastante, quais os desafios que estes doentes enfrentam nos dias de hoje?
Infelizmente nos dias de hoje, ainda existem muitos doentes que enfrentam desafios em relação a esta doença. O estigma que está associado a este vírus é terrível, as pessoas ainda se escondem devido à sua religião, etnia e costumes porque têm medo da descriminação e de represálias. Na altura que me foi diagnosticado e eu estando grávida associaram-me logo como trabalhadora do sexo e não o era. O VIH/SIDA está associado a todo o tipo de classes e pessoas e temos que quebrar o preconceito e estamos no caminho e na luta.
Considera que em pleno Sec.XXI ainda existe muito preconceito, estigma e tabu desta doença por parte da nossa sociedade?
Sim, e onde eu fui mais descriminada foi no SNS, em que apresentei queixa. Sinto-me muito triste quando vejo que as pessoas que trabalham nos nossos serviços de saúde muitas vezes não estão preparados, nem têm conhecimento suficiente para lidarem com pessoas com VIH/SIDA em que discriminam muito estes doentes o que de facto é muito revoltante.
Sexualmente realizada. Vida Feliz. É o lema do Love with Pepper, concorda?
Concordo. Porque temos que lutar a vida toda para sermos felizes e apesar desta adversidade que a vida me colocou, sinto que com os tratamentos e a medicação que faço e qualidade de vida que tenho consigo ser feliz a todos os níveis.
Apesar de tudo o sexo é bom?
Claro que sim! Bom e prazeroso.
O AMOR vence o preconceito?
O AMOR vence tudo, porque quando é Amor verdadeiro nós não valorizamos os defeitos, valorizamos um todo e quando este é mesmo real vence tudo.
Maria João Brás Santa Maria, Coordenadora Projeto Red Light
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