A Sexualidade em Sinais e Gestos, por Alexandra Ramos
15 de Novembro 2024, Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa
Alexandra Ramos, é dos rostos diários da nossa televisão, para além de ser uma mulher dinâmica, divertida, amiga dos seus amigos, mãe de 5 filhos e avó de dois netos, é intérprete de Língua Gestual Portuguesa.
A sua paixão por esta língua nasceu através dos pais, que são surdos, sendo que a mãe nasceu surda e o pai ficou surdo aos 2 anos de idade, devido a varicela.
Esta mulher sempre sonhou ser hospedeira de bordo, mas a vida encaminhou-a desde cedo para outros caminhos. Com os pais surdos, Alexandra viu-se obrigada a ser a sua intérprete assim que aprendeu a comunicar e aos 15 anos já trabalhava na associação que o pai criou, em Almada, como secretária e intérprete.
Teve uma infância dedicada a fazer traduções, tendo a sua liberdade ficado para trás. Apenas nas férias se sentia verdadeiramente livre, quando estava com a avó. Aí não havia nem relatos de futebol para traduzir ao pai, nem novelas para traduzir à mãe.
Considera que a sua profissão é a sua missão de vida e é bom saber que o seu trabalho chega à comunidade surda, como quando recebe um abraço nos eventos que organizam.
Nesta entrevista ao Love with Pepper, Alexandra mostra o quão é importante a sexualidade na Língua Gestual Portuguesa (LGP).
O que é a língua gestual?
A Língua Gestual Portuguesa é a língua da comunidade surda, onde se inclui todos aqueles que comunicam com as pessoas surdas, os pais, os professores…
Para si o que é a surdez?
Para mim a surdez é uma terminologia médica, perda de audição severa, média ou profunda.
Que relação existe entre a surdez, a língua gestual e a sexualidade?
A mesma que existe para a comunidade ouvinte. A surdez não impede a sexualidade, nem a língua gestual. Eu nasci filha de pais surdos.
Qual é o papel do intérprete da língua gestual ao facilitar a comunicação sobre questões de sexualidade para pessoas surdas?
Compete ao intérprete de língua gestual traduzir fielmente o que ouve de um especialista. Se for numa conferência ou consulta médica, da mesma forma o deve fazer. Se uma pessoa surda tiver dúvidas, o intérprete deve traduzir fielmente.
Que desafios enfrentam os interpretes de língua gestual ao interpretar assuntos relacionados com a sexualidade?
O intérprete de LGP deve ter consciência da tradução que vai fazer sem qualquer tipo de pudor.
Como gesticula de forma compreensiva e respeitosa a abordagem de conceitos sexuais sensíveis para a comunidade surda?
Os gestos são icónicos, ilustram e dão a forma com clareza. Obviamente ao executar o gesto, como se vê e imagina a ejaculação, então é fazer o gesto que representa a forma.
De que forma a comunidade surda influência na interpretação de questões relacionadas à sexualidade?
A sexualidade é um tema abordado como normal, na eventualidade do intérprete não conhecer o gesto, a comunidade surda diz como se faz.
Que estratégias utiliza para comunicar assuntos relacionados com a sexualidade junto das pessoas surdas?
Com naturalidade.
Que recursos estão disponíveis para os interpretes de língua gestual sobre as questões de sexualidade?
Os recursos são-nos dados pela própria comunidade surda.
Como aborda questões sobre diversidade sexual e identidade de género na comunidade surda?
Já me aconteceu estar numa conferência sobre esse tema e não saber executar o gesto. Recorri à dactilologia da língua gestual e, de seguida, eles deram o gesto para o referido conceito.
Considera que a educação sexual está acessível à comunidade surda? A Alexandra e outros intérpretes poderiam contribuir para promover uma educação sexual mais inclusiva nas escolas, direcionada para crianças e jovens com surdez?
Nas escolas não abordam esse tema, contudo os intérpretes estão nas escolas e podiam traduzir aulas sobre sexualidade. Parte sempre da comunidade surda a iniciativa de promover esses eventos. No entanto, já existem conferências sobre o tema onde contratam intérpretes e os surdos participam.
A sexualidade envolve os cinco sentidos. Será que a ausência de um desses sentidos aumenta a sensibilidade dos restantes e, de certa maneira, torna o sexo ainda mais envolvente e satisfatório?
Não. O sexo é igual, uns tem mais prazer que outros, outros não tem, tal e qual como na sociedade.
Considera que os preconceitos/tabus na sociedade podem privar os surdos de uma vivência sexual plena e intensa?
Numa relação de pares, entre surdos, não. Entre ouvinte e surdo a tendência é de maior respeito e aceitação, pelos casais que conheço.
Acha que os surdos têm uma perceção positiva da sexualidade?
Têm sim, até fazem piadas sobre a sexualidade. Não no ponto de vista de "ter vontade," mas com muito humor.
O que falta fazer pela comunidade surda no nosso país?
Acessibilidade através da Língua Gestual Portuguesa, falta um Lar para a comunidade surda. Não para ser um gesto, mas pela barreira da comunicação… um Lar de Surdos onde a comunicação é plena. Imaginar uma pessoa surda num Lar de ouvintes, sem conseguir comunicar na sua própria língua, torna-a mais isolada do mundo.
Sexualmente realizada. Vida feliz. É o lema do Love with Pepper, concorda?
Não é o mais importante, mas, sim, um complemento para uma vida feliz.
O #AMOR vence o preconceito?
Vence. Em relação à comunidade surda visto que há atualmente mais visibilidade através da comunicação social, o preconceito vai-se desvanecendo. Ou seja, não existe aquele pensar que o surdo é o coitadinho e o desgraçado da sociedade. Vejo casais em que um é ouvinte e o outro é surdo e existe amor e isso é bonito de se ver. E, sim, o amor vence tudo.
Alexandra Ramos, Intérprete de Língua Gestual Portuguesa
Posts recentes
Ver tudo21 de Março de 2025, Dia Mundial da Trissomia 21 Andreia Paes de Vasconcellos, empreendedora, casada, mãe de quatro filhos e um especial,...
Catarina Alves Costa, 32 anos, é casada, Mãe, arquiteta e é natural de Ponte de Lima. Está em fase de recuperação de um distúrbio...
A sexualidade é uma parte fundamental da experiência humana, influenciando a forma como nos relacionamos connosco e com os outros. Quando...
Comments